Vernacular
Os usos da palavra Vernáculo e suas derivações estão diretamente ligados às formas nativas de saberes e viveres relacionadas ao popular. Na linguística empregam-se designando o idioma utilizado no falar e escrever característicos de uma região livre de estrangeirismos. A arquitetura vernácula, ou vernacular, refere-se àquela feita com recursos naturais e técnicas próprias da região onde a edificação está inserida.
Já o design vernacular é uma denominação atribuída às técnicas manuais, tais como tipografia ou iconografia, que atendem às necessidades básicas e demandas de comunicação de uma localidade específica utilizando-se de um conhecimento não acadêmico. Compreendemos que estas definições são tendenciosamente conservadoras e deixam escapar detalhes que estão nos cruzamentos, nas encruzilhadas nos hibridismos que formam a cultura brasileira. Logo, o artista adota nesta mostra a ideia de que o Vernacular é produzido fora das instâncias e instituições hegemônicas.
Também presente no título, o lar é observado pelo artista não só como o domicílio familiar, mas como o lugar onde os ancestrais são cultuados e as lutas são iniciadas. Sejam em objetos presentes no cotidiano doméstico, em altares e nas devoções periféricas, ou no combate permanente pelo direito ao território.
É a partir do lar que as tradições são inventadas e as identidades vivenciadas. E essa cultura local “negocia” constantemente com a cultura global, promovendo encontros – ou choques. São nessas zonas de contato que o vernacular se faz.
É importante destacar, portanto, as influências dos povos nativos e afro-diaspóricos na formação do Vernacular brasileiro presentes nas obras de Thiago Modesto. Compreendemos que os laços físicos e espirituais que conectavam os nativos e africanos com suas matrizes e ancestralidades foram desfeitos brutalmente no Brasil por conta da violenta colonização. Longe de exaltar uma democracia racial, o artista parte da observação dos encontros culturais e ancestrais destes povos como possibilidades em subverter imposições forçosas e violentas, atuando nas brechas e frestas através de sabedorias transgressoras.
A partir destas reflexões é apresentada a proposta de ocupação do espaço Corda com a exposição individual “Vernacular” de Thiago Modesto. Thiago é carioca, designer e gravurista; oriundo de família migrante de Santo Antônio de Pádua, noroeste do estado do Rio de Janeiro e estabelecido há mais de três décadas na cidade do Rio de Janeiro.
Em instalações, retratos, cenas cotidianas ou fantásticas, Thiago Modesto celebra sua busca do sentido da experiência da vida através da arte alinhada com o sentido de sociedade intrínseco no conceito de ancestralidade. Thiago Modesto apresenta nesta exposição sua visão de mundo influenciada por diversas cosmopercepções reverenciando os saberes ancestrais dos territórios com que se relaciona.
Bernardo Marques-Baptista